segunda-feira, junho 16, 2008

A arte de escrever...


A madeira é golpeada incessantemente provocando um som ritmado, quase musical. A cada toque violento, mas cuidadoso da talhadeira, a matéria-prima toma forma. O que há algumas horas, não passava de um pequeno tronco, filho da mãe-natureza, torna-se enteado de uma artista plástico qualquer.

Da mesma forma, a argila cria vida nas mãos do ser humano que a molda ao seu prazer, ela passa a ser um reflexo dos anseios e da alma do escultor. Ao mesmo tempo, em uma sala qualquer, num lugar qualquer, pincéis se movem aceleradamente, se unindo à tela branca para dar cor e transformar pensamentos em arte, em retratos aquarelizados de uma realidade possível ou imaginada.

Mas nem de longe essas artes me fascinam mais do que aquela que pratico, todos os dias,
sempre enquanto aprendiz. Um processo mutável, frustrante e ao mesmo tempo inebriante e realizador. Uma prática que só é possível graças a dependência que ela provoca devido ao contato diário e a busca pela perfeição na execução.

À base de tinteiro, penas, movimentos sinuosos de uma esferográfica ou mesmo em toques alardeadores num teclado de computador, a escrita nunca deixou de ser uma arte cheia de belas e por vezes enigmáticas representações. Pois sim, escrever é uma arte.

Independente do idioma, trazer pensamentos para o papel não é uma simples tarefa. Não é como escolher uma peça de roupa dentre várias em um closet. Escrever é muito mais, é transcender as barreiras do tangível para um universo diferente, onde as palavras têm vida. É compreender não apenas o significado de cada uma delas, mas perceber que nova realidade poderá ser criada a partir dessa união alfabética.

Pôr letras juntas e com um sentido maior do que as verbetes literalmente dizem é um desafio. É lutar para escolher não só cores, mas também as tonalidades, é dar forma a algo inexistente, é transformar a pedra num objeto de deleite, notas musicais díspares e incongruentes em uma suave e agradável melodia.

Escrever é ser ator. É interpretar papéis diversos. Simular raiva, ódio. Mas também, amor e carinho. Paradoxalmente, é criticar mesmo quando se gosta, elogiar a mediocridade. É viajar por lugares onde nunca se esteve e, ainda sim, dar a impressão de que aquele lugar é íntimo e está traduzido nos detalhes, presentificado, diante de seu anônimo interlocutor.

Essa é uma arte das que mais provocam paixão. Um sentimento arrebatador que destrói e ilumina corações. Linhas que deturpam a percepção de uns e abre os olhos de outros. O escritor tem um poder sem precedentes. Ele pode conjurar quimeras e paixões, chuva e sol, mover montanhas ou dirigir-se a elas sem o movimento maior que o da mão, partindo do tinteiro para a reluzente folha branca. Ele pode tornar vivas as palavras num trabalho de alquimia, buscando a mistura certa, o ponto ideal, no qual, nunca se chega.

Nesse caminho tortuoso e alucinante, os alquímicos das palavras perseguem a pedra filosofal, caçam o pulo do gato, querem o segredo da perfeição a fim de tornar suas criações mais sublimes e indefectíveis do que já são. A partir delas, eles conseguem induzir ações, traduzir emoções , reiterar seus próprios acessos de loucura. Mas sem dúvida, eles estão cientes, de que a perfeição é o único objetivo o qual eles provelmente nunca deverão alcançar.

Nesse sentimento de frustração e êxtase aventureira protagonizado por eles, os escritores, e do qual eu compartilho, deixo meu voto de pesar, pois por saber que, apesar de todos os poderes que lhes são conferidos, essas criaturas dotadas de um toque divino, ainda não passam de seres humanos limitados por sua própria natureza passional, qualidade essa primordial para a missão impossível que é a arte de escrever, mas não fazê-lo de qualquer forma, mas sim com a plenitude e a simplicidade de quem escreve bem...

terça-feira, junho 03, 2008

Ele só quer um pouquinho de atenção...

Ele está abandonado. Sentindo-se só e sem apoio. São muitos dias sem ninguém dar-lhe a devida atenção. Nem mesmo seu pai, seu criador, o visita. Mas já que ele foi posto no mundo, ele quer ter pessoas ao seu redor, quer que falem sobre ele, comente.

Na verdade, para ele não importa quem são, de onde vem ou mesmo o que fazem, se possuem nível superior, pós-graduação ou somente sabem ler. Ele se nega a ser bajulado, apesar de lá no fundo gostar, por outro lado, não quer ser ofendido, mas adora quando pode responder a altura uma boa crítica.

O que ele realmente quer é crescer, se tornar mais forte e conhecido por muitos, assim como outros tantos que existem por aí. Por que eles seriam melhor do que ele?

Talvez ele não esteja sendo alimentado como deveria, comer pouco faz mal e é prejudicial a saúde e ao espiríto. Esse abandono sazonal faz com que lhe faltem forças para que ele possa atrair a atenção dos que lhe rodeiam, mas que mesmo estando tão perto, não o percebem.

Pode ser que seu comportamento tenha oscilado e por isso não tenha agradado algumas pessoas, fazendo com que elas perdessem a intimidade com ele. Às vezes ele é crítico demais, em outros momentos é lascivo, já foi sedutor, às vezes se perde na preguiça, mas sempre tem algo a dizer sobre qualquer assunto e, por esse motivo, sempre merecerá a atenção de algum transeunte.

Sua fome está cada vez maior e ele está cobrando de seu criador. Ele não suporta a solidão e pretende lutar para sobreviver nesta árdua competição diária que se intensifica ainda mais com o passar dos tempos.

E, mesmo quando estiver fraco e só, ele ainda terá forças para trazer tudo que pensa para a realidade de outras pessoas e fazer com que sua Consciência Projetada se manifeste em alto e bom som.