sábado, julho 19, 2008

A areia certa na ampulheta...

Acordei cedo hoje, tomei meu café da manhã como de costume e junto com um amigo peguei um transporte coletivo, bem recheado, com algumas dezenas de pessoas. Algumas conversavam, outras apenas observavam as cenas cotidianas pela janela do ônibus, umas liam e muitas estavam apenas perdidas em seus pensamentos.

Mas eu, pelo contrário, não estava perdido. Me mantinha enclausurado neles de propósito. A cada prédio que passava por mim, a mais de 50 quilômetros por hora, me vinha a lembrança de como essa semana havia passado rápido. Pior, como estes últimos meses e anos eram engolidos como areia fina numa ampulheta faminta.

A cada rosto veloz, alheio a mim, sentia como se a vida estivesse sendo devorada, arrebatada de uma forma sutil e explícita. Um dia após outro acabava reduzido a telefonemas vazios e a encontros rápidos com a família para refeições mais rápidas ainda.

O fast não é mais exclusividade do food. A vida de hoje tornou-se um simples sanduíche, sendo o sabor o menos importante , valendo mais o puro e simples ato de comer. É o fast-lifestyle. A existência efêmera, dom presente em nossos corpos, não é mais tão apreciada e poucos ainda a degustam tal qual uma iguaria culinária, uma ambrosia, que a qualquer momento pode sair da prateleira.

A vida deixou de ser aquela música preferida, que quando próxima do fim, faz com que o botão do replay seja pressionado para que a canção seja entoada mais uma vez, simplesmente pelo prazer que ela pode proporcionar. A vida agora tem um cheiro qualquer, não possui mais sutilezas e texturas, não é mais a mesma, não é mais do que os olhos podem ver.

Ela chega todos os dias no mesmo horário, tem duas horas para almoço e no máximo seis para dormir. Não sente mais prazer, só come bobagem e tem o colesterol nas alturas. Está obesa, depressiva e sozinha. Mais sozinha do que nunca.

Estamos numa existência amparada em uma areia extremamente fina. Sem asperezas e resistências e que se locomove através do pequeno corredor numa velocidade vertiginosa e imperceptível. Ela se tornou uma viagem de ônibus diária, que passa sempre pelos mesmos pontos, mas que nunca proporciona emoções e surpresas.

Quem sabe o segredo não esteja nos instrumentos que temos a disposição? Ninguém nunca disse que era proibido manuseá-los. A ampulheta voraz e o ônibus constante podem ter seus movimentos alterados. Por que não virar ampulheta sempre que o último grão estiver prestes a cair? Por que não fretarmos o ônibus e escolhermos o nosso próprio itinerário, ou mesmo assumirmos o volante? Por que não aproveitarmos todo o tempo que achamos que não temos?

Deveríamos esquecer a aritimética ignorante, a qual nos faz esperar 5 dias para aproveitarmos apenas 2, e gozarmos os 7.

Pensando assim, ao final de tudo, quando o veículo estiver prestes a parar de funcionar, a quilometragem extra irá, sem sombra de dúvidas, ter valido a pena, pois o fast dará lugar ao life para a ampulheta ser preenchida com a areia certa...

Um comentário:

Hugo Andrade disse...

É isso mesmo, caro amigo, estamos caminhando para uma sociedade superficial. Mas enquanto existir pessoas com os mesmos pensamentos que você, acho que ainda poderemos fazer algo! =/

mais uma vez, texto paaaaaw!!!